LULISMO, COMOÇÃO NACIONAL, PERSEGUIÇÃO
POLÍTICA E AS ELEIÇÕES DE 2022
Possuímos
a impressão real de que as eleições de 2018 não acabaram... O presidente eleito
Jair Messias Bolsonaro nunca saiu do palanque. Por vários motivos, o que inclui
a sua lógica necropolítica de que o discurso de crise e de vitimismo são
eficazes para a manutenção de um percentual aceitável de popularidade entre os
seus seguidores. Hoje esse percentual ainda é suficiente para levá-lo ao
segundo turno. Enquanto isso, todas as outras forças políticas do país tentam
articular um anti-bolsonarismo da mesma forma com a qual já construíram
anteriormente um antipetismo, evidentemente guardando as devidas diferenças,
mas o sentido deverá ser o mesmo se essas forças quiserem vencer Bolsonaro.
Em
meio a essas constatações mínimas um episódio passou a dar cores novas no
quadro situacional da política do país. Lula entra no jogo político eleitoral
de 2022.
Luís
Inácio Lula da Silva, ex-presidente da república foi preso, por decisão
judicial em segunda instância, aos 73 anos de idade, e assim ficou durante 580
dias. O tempo passou exatos três anos, e já em casa ele acaba recebendo a
notícia de que o julgamento não valia pelo fato de que o caso não poderia ter
sido julgado onde foi. A partir de então uma onda de discursos, narrativas e percepções
apaixonadas tomam conta do país. E por quê? Lula é uma das figuras mais
emblemáticas e representativas da história política do Brasil democrático, e,
além disso, ele encarna a representação dos discursos mais apaixonados, seja
para adorá-lo ou para detratá-lo. Dificilmente encontraremos um brasileiro que
não se apeteça com a figura de Lula, e certamente um desses brasileiros é o
atual presidente Jair Messias Bolsonaro. Tudo mudou na parca mentalidade de
Bolsonaro quando o julgamento foi considerado nulo e Lula potencialmente
elegível.
Algumas
interpretações rapsódias sobre a decisão do ministro Fachin:
1.
Sim, a decisão foi política. Certamente ninguém
acredita que, após tanto tempo, o ministro tomou a decisão por que teria
encontrado uma falha técnica no processo;
2.
Sérgio Moro estava prestes a ser designado
como suspeito no processo de Lula, principalmente após as denúncias e
evidências mostradas pela “vaza jato” onde ficou caracterizada a sua influência
sobre os procuradores da força tarefa. Também considerando que as provas foram
coletadas de forma ilegal. Ou seja, o que assistimos foi um jogo de cartas
marcadas;
3.
E se “onde passa um boi passa uma boiada”
essa decisão do ministro Fachin também abre a possibilidade de que todas as
decisões da Lava Jato sejam consideradas nulas;
4.
E o que pareceu ser um jogo para livrar Lula
na verdade, com a nulidade do processo, salvará Moro de ser investigado pela
sua interferência no processo.
Finalmente
temos uma ferida aberta. Ferida essa que todos sabem que existe... Do
brasileiro mais humilde até o mais abastado, sabemos que a justiça no Brasil é
feita conforme os contextos e interesses das classes que dominam as letras e
dominam o jogo político. E mais, que as decisões estão sempre ligadas à
interesses pessoais. Vamos nos lembrar da decisão do ministro Gilmar Mendes,
maior debatedor da parcialidade de Sérgio Moro, quando a alguns anos atrás
mandou soltar um empresário no Rio de Janeiro, cuja filha ele tinha sido
padrinho de casamento[1].
Ou seja, realmente todas as peçonhas são venenosas.
Obviamente
que não existem garantias de como as eleições de 2022 vão terminar, mas é claro
que teremos um Bolsonaro muito mais desgastado se Lula estiver no pleito.
O
discurso inflamado do líder histórico do PT, na sede dos metalúrgicos em São
Bernardo do Campo deve ter sido visto por Jair Bolsonaro debaixo da cama, semelhante
à quando éramos crianças e estávamos com medo do bicho papão. Pelo menos foi o
que pareceu, em seu primeiro pronunciamento após a libertação do ex-presidente.
Todos sabiam que era o Bolsonaro, mas ele realmente estava diferente... Até a
decoração do cenário mudou um pouco com o acréscimo de um globo terrestre. E
olhem que a live costumeira das quintas-feiras de Bolsonaro é um verdadeiro
circo dos horrores, em que frequentemente ele vomita todas as suas
improbidades. Inclusive acreditamos que um dia se fará necessário que a
imprensa brasileira seja vigilante e corajosa o suficiente, da mesma forma que
a americana foi ao termino do governo Trump. Praticamente todas as vezes que o
presidente americano mentia descaradamente, ou a sua fala era cortada ou o
“mentirometro” era ligado e a população era informada que aquelas sentenças
proferidas por ele eram falsas.
Um
dos problemas marcantes de uma provável disputa entre Bolsonaro e Lula, além
delas reforçarem nosso maniqueísmo político é que ela está pautada na ligação afetiva
que as pessoas têm à lideres carismáticos. Resguardando suas devidas diferenças,
Lula e Bolsonaro trazem à pauta política do país um apelo forte às emoções e a
sentimentos que estão relacionados a construção de um patriarcado político
nacional. Em um país que precisa urgentemente de saídas conscientes, planejadas
e responsáveis para problemas complexos o resultado desse maniqueísmo é sempre
o mesmo: ou amor devotado ou ódio ressentido. É claro que Bolsonaro prefere mil
vezes encarar Haddad e até mesmo Ciro Gomes, que possuem um perfil bastante
acadêmico, portanto, um tanto quanto afastados da linguagem popular das massas,
do que enfrentar Lula. Para o enfrentamento a Haddad e Ciro a saída simples
para Bolsonaro seria a de fugir do debate político direto, pois realmente não
teria chances, mas contra Lula, certamente a disputa seria no corpo a corpo e
como em todo ringe de UFC o sague jorraria...
Pensemos
então nas atribuições mecânicas dos três poderes da nossa nação, e que hoje estão
enferrujados pela crise em que estamos vivendo com o corona vírus. A crise agravada
com a briga política entre os poderes, em âmbito nacional, estadual e municipal
e liderada pelo olho do furacão que é o presidente da república. Em tese o
poder legislativo seria o mais político, cabendo ser o representante dos vários
diálogos regionais em um debate público amplo. Salientando que o seu principal
problema é a corrupção advinda, inclusive, do fisiologismo e interesses de
grupos específicos que são patrocinadores de políticos. O poder executivo fica
literalmente no meio, sendo político também, mas cabendo-lhe a necessidade de
ser técnico, ou seja, tendo a responsabilidade de operacionalizar as políticas
públicas em todos os seus âmbitos. Precisa cumprir as leis e o orçamento em
equidade com as necessidades da população. Já o poder judiciário deveria ser o
menos político dos três, mesmo que esteja sendo, ultimamente, uma das vozes
mais ativas de contensão dos arroubos golpistas do presidente Bolsonaro. Mas
por estar sendo tão político, o Judiciário acaba se configurando como uma das fontes
de instabilidade mais claras da nossa democracia. Temos que viver com mais essa
tensão diariamente. Não é a toa que talvez sejamos a primeira geração de
brasileiros que sabe os nomes de vários ministros do supremo, mas não sabe toda
a escalação da seleção brasileira.
De
todas as formas o Supremo Tribunal Federal está errado. Pensemos. Se a decisão
de Fachin estiver correta, ou seja, de que o processo de Lula deve ser anulado
e que tudo volte ao ponto de partida, ela serviu à época para que Sérgio Moro
retirasse o principal opositor de Bolsonaro do páreo eleitoral. Com o agravo de
que Sérgio Moro tornou-se ministro da justiça posteriormente, temos que nos lembrar
deste fato. Uma interferência inadmissível no processo democrático. Mas se a decisão do ministro do supremo
estiver errada ela recai sobre outro problema sério, que seria o de colocar no
páreo eleitoral de 2022 um candidato ilegal.
Enquanto
esse teatro shakespeariano se arrasta, milhares de compatriotas morrem
crucificados pelo corona vírus, e com a fúria de um algoz, Bolsonaro passa
outra vez a ter uma cortina de fumaça eficaz. Ameaçado pela concorrência
eleitoral de Lula, o presidente e seus asseclas partem para a perseguição judicial
dos seus opositores mais midiáticos... Nesse momento os alvos são o youtuber Felipe
Neto, um professor universitário do Rio Grande do Sul e o eterno pré-candidato
a presidência Ciro Gomes. Cheirinho de golpe no ar outra vez.
Daniel
Marinho é professor de História, assessor pedagógico e rapsodo dos sertões.
Excelente texto, maravilhosa reflexão, caríssimo Mestre.
ResponderExcluirBem escrito e de muita lucidez.
ResponderExcluirAmei sua reflexão, Daniel. Vivemos eternamente assim: de golpe em golpe!
ResponderExcluirAmei sua reflexão, Daniel. Vivemos eternamente assim: de golpe em golpe!
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